Direção: Hilton Lacerda
Elenco: Irandhir Santos, Suzy Lopes, Gustavo Patriota, Amanda Beça, Safira Moreira, Leandro Vila, Ariclenes Barroso, Arthur Canavarro, Nash Laila, Hermila Guedes, Jean Thomas Bernardini, Maria Barreira, Geyson Luiz, Nínive Caldas.
Ano: 2020
Sinopse: O carnaval chegou ao fim. Uma jovem francesa foi brutalmente assassinada na cidade do Recife. O policial Breno volta antecipadamente de suas férias para investigar o crime, surpreendendo seu filho com três amigos hospedados em sua casa. Enquanto procura por pistas, a cidade desenterra traumas do passado de Breno e revela um estranho universo de lugares e memórias.
Crítica do CINEVITOR: Como roteirista, Hilton Lacerda escreveu diversos filmes brasileiros aclamados pela crítica, entre eles, Amarelo Manga e Febre do Rato, ambos de Cláudio Assis. Em 2013, lançou seu primeiro longa-metragem como diretor, o premiado Tatuagem. Com Fim de Festa, seu segundo filme de ficção na direção, já chega com os prêmios de melhor filme e roteiro no Festival do Rio do ano passado. Protagonizado pelo talentoso Irandhir Santos, a história tem como pano de fundo a festa mais alegre do ano: o carnaval. Com gostinho de ressaca, Fim de Festa apresenta uma investigação sobre uma jovem francesa que foi brutalmente assassinada no Recife. O policial Breno, papel de Irandhir, precisa investigar o crime e, para isso, interrompe suas férias. Quando chega em casa, encontra seu filho e mais alguns amigos que estão hospedados por lá. Enquanto nos revela pistas desse quebra-cabeça, Hilton constrói com maestria uma narrativa que transita por diversas camadas: além do crime, o espectador também passa a conhecer um pouco mais sobre a vida pessoal desses personagens de forma natural e instigante. É interessante também analisar a maneira como o diretor e roteirista traz o carnaval no contexto da violência; apesar de ser uma festa que celebra a alegria, é possível se deparar com um número alto de homicídios durante os festejos. Com isso, Fim de Festa traça um arco dramático que passa pelas relações afetivas e profissionais e ainda consegue construir um olhar contundente sobre o Brasil atual, que condiz muito à nossa realidade. Com um elenco talentoso, que imprime com naturalidade o texto de Lacerda, somos surpreendidos a todo instante com o desenrolar dos acontecimentos. O entrosamento entre classes e gerações é também um ponto alto de Fim de Festa e Hilton consegue expressar com empatia essas conexões sociais. Aqui, vemos jovens engajados politicamente (e virtualmente) e desprovidos de preconceito. Fala-se do amor livre, do corpo, de retrocesso, da força da tecnologia (como as notícias repercutem e são desvendadas na internet) e da luta contra o conservadorismo. Ao mesmo tempo, conecta a liberdade dessa geração com personagens mais complexos e retraídos. O roteiro segue um fluxo dinâmico por conta da costura narrativa que Hilton faz muito bem: soa natural a forma como ele cria uma situação com um determinado diálogo e, de repente, insere elementos de fora daquele assunto que se conectam. É possível conhecer um pouco mais desses personagens, mesmo sem saber muito deles, apenas com informações pontuais reveladas. Ainda que seja uma ficção, Fim de Festa é verossímil com a realidade. Muito por conta de seus personagens, suas questões emocionais e a maneira como se relacionam com o ambiente em que estão. Suzy Lopes, por exemplo, interpreta muito bem Alice, uma mulher caricata e afetada que precisa chamar atenção o tempo todo, mesmo que opte por difamar alguém por conta de sua condição financeira ou classe social: status quo. Irandhir, que transborda talento em cena, vive um pai disponível a se reinventar, porém melancólico, que carrega um passado que ainda o atormenta. Suas cenas com o filho, interpretado pelo ótimo ator Gustavo Patriota, são sempre carregadas de afeto e com diálogos interpretados com espontaneidade. Vale destacar também a cena com Hermila Guedes: um deleite de atuações. Apesar dos mistérios de um assassinato na narrativa, Fim de Festa não é um filme de suspense. O crime é mais um dos motes do roteiro, assim como as relações pessoais, profissionais, sociais e familiares. Essa mistura de acontecimentos possibilita diversas camadas de leitura do filme de Hilton Lacerda, o que o torna ainda mais interessante: enxerga-se pelo lado político e de como o Estado não dá conta de suas funções; percebe-se o impacto do carnaval na vida de seus personagens; e introduz uma certa melancolia acompanhada de uma ressaca física e moral. Fim de Festa é uma coletânea de situações e assuntos diversos muito bem orquestrada, que retrata circunstâncias atuais da nossa sociedade com verossimilhança e naturalidade. Todo carnaval tem seu fim e consequências. (Vitor Búrigo)
*Clique aqui e assista aos programas especiais sobre o filme com entrevistas com os atores Irandhir Santos e Suzy Lopes e com o diretor.
Nota do CINEVITOR: