Entrevista: Giovani Borba fala sobre Casa Vazia, filme exibido no 11º Olhar de Cinema

por: Cinevitor
O diretor gaúcho no Cine Passeio.

Depois de ser exibido no Festival do Rio, o longa gaúcho Casa Vazia, dirigido por Giovani Borba, foi um dos destaques da mostra Olhares Brasil da 11ª edição do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba.

Na trama, Raúl, interpretado por Hugo Nogueira, é um peão desempregado e pai de família que vive em uma casa isolada na imensidão solitária dos campos do Pampa. A mão de obra tradicional da lida no campo já não serve mais aos patrões, donos das terras. A paisagem de imensas pastagens com o gado estão sendo sobrepostas por gigantescas lavouras de soja. Assolado pela pobreza e a falta de trabalho, ele se junta a outros peões para roubar gado durante a escuridão das noites no campo. Ao retornar de mais uma madrugada, encontra sua casa vazia: sua mulher e filhos desapareceram.​

Conversamos com o diretor logo depois das exibições em Curitiba, no Cine Passeio, sobre a ideia do projeto, elenco, bastidores e repercussão do filme. Confira os melhores momentos:

ROTEIRO

“Eu fiz um primeiro tratamento do roteiro, que era mais focado na questão familiar, mas ainda estava bem cru. Depois disso, fui para a região onde filmamos para ouvir histórias e fui escrevendo outros tratamentos. Também fui absorvendo o jeito que falavam e adaptando os diálogos para uma linguagem bem regional. Nesse processo de pesquisa acabei conhecendo várias pessoas, que foram entrando no filme”.

ELENCO

“Até cheguei a pensar em fazer com um elenco 100% de atores profissionais. Mas o filme estava extremamente não narrativo e aí eu comecei a pontuar algumas coisas e achei melhor misturar com não atores e deixar que os profissionais dessem um suporte melhor para o drama”.

PROTAGONISTA

“Eu estava falando sobre o filme com uma amiga, contando sobre o personagem e ela disse que tinha alguém para me apresentar. Fomos na casa do Hugo, mas ele não estava. Depois eu voltei e tivemos a primeira conversa. Foram vários momentos até eu decidir que ele estaria no filme. Em nenhum momento ele se deslumbrou com o projeto e sempre foi muito cara de pau, sem ter vergonha de nada. Não ficou nervoso e nem tenso. O tempo inteiro ele brincava e estava muito tranquilo, mas levou a sério. Ele é muito diferente do personagem. É um cara alegre, divertido e fez aquele personagem muito bem em um desenho muito bem construído”

“Fizemos uma preparação de elenco bem forte. Quando começamos não entreguei o roteiro para ele, que passava as cenas comigo e com a preparadora de elenco. Eu falava que não precisava se preocupar com o que estava escrito no roteiro. A ideia era mostrar o que estava no texto, só que do jeito deles. Até porque o roteiro também tinha coisas que vinham da boca deles”.

Hugo Nogueira em cena.

REGIONALISMO

“Eu queria que fosse um filme bem regional. Queria que fosse naquele lugar, com as pessoas daquele jeito, algo bem autêntico do local. Tive até uma certa dificuldade em pegar atores de Porto Alegre, por exemplo, pela diferença grande de sotaque. Consegui alguns atores que nasceram mesmo na fronteira e tiveram que resgatar o sotaque da infância. O único ator de Porto Alegre se puxou mais para se adaptar ao sotaque, fez um laboratório com um cara muito parecido com o personagem dele e pegou muito os trejeitos dele”.

FESTIVAIS

“Aqui no Olhar de Cinema as pessoas entraram mais nas questões do elenco e do regionalismo. Já no Festival do Rio era uma cena diferente e uma cultura que as pessoas não estavam tão familiarizadas. Eu também tinha medo que talvez não entendessem o sotaque porque tem um portunhol no meio, mas acabou funcionando. Nos preocupamos muito com a pronúncia das palavras e trabalhamos na preparação de elenco para ter uma clareza na fala. Eu acho bonito quando tem essa autenticidade dentro de um filme, que trazem questões bem regionais, como por exemplo os filmes nordestinos. Eu posso não entender alguma gíria, mas entendo o contexto. Pra mim, como público, não incomoda. Pelo contrário, eu valorizo”.

GAÚCHO

“Eu nunca quis perder a originalidade daquele lugar para falar daquelas pessoas. Eu queria apresentar aquele universo de uma maneira muito autêntica, exatamente como ele é. Até para sustentar minha própria inflexão crítica sobre a construção da imagem do gaúcho; no caso, um gaúcho heroico, branco, valente, que nada abala, muito machão. É uma cultura muito caricata que, na verdade, não representa o que realmente é o Rio Grande do Sul na sua história e no seu povo. A história foi forjada. A formação do Rio Grande do Sul tem uma influência fortíssima de guarani e não tem nada na cultura institucionalizada do estado que dê muito valor para o índio dentro dessa história. O índio ficou para trás, assim como os negros”.

*O CINEVITOR está em Curitiba e você acompanha a cobertura do 11º Olhar de Cinema por aqui, pelo canal no YouTube e pelas redes sociais: Twitter, Facebook e Instagram.

Fotos: Marcelo Deguchi e Divulgação.

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