Esquirlas
Direção: Natalia Garayalde
Ano: 2020
Sinopse: No dia 3 de novembro de 1995, a emblemática Fábrica de Munições Militares Río Tercero, na Argentina, explodiu na cidade natal da diretora, que tinha 12 anos na época. Enquanto milhares de projéteis foram disparados contra a cidade, Natalia Garayalde gravava a devastação com uma câmera de vídeo. Vinte anos depois, ela encontra essas fitas.
Crítica: Nos anos 1990, uma pequena cidade localizada na província de Córdoba, na Argentina, chamada Río Tercero, virou notícia mundial por conta de uma tragédia que aterrorizou a população: uma fábrica de munições militares explodiu e disparou projéteis para todos os cantos da cidade. Naquela época, Carlos Menem era o presidente do país, a MTV fazia sucesso na TV entre os jovens e as crianças brincavam nas ruas. A cineasta Natalia Garayalde, que tinha 12 anos quando tudo aconteceu, morava com sua família perto do local do acidente. Radiante com seu novo brinquedo, uma câmera de vídeo, registrava tudo o que via pela frente. Não foi diferente com o trágico ocorrido. Enquanto tentava escapar da explosão, gravava a devastação do local sem nem imaginar para onde iriam essas imagens (ou se seriam úteis em algum momento). Vinte anos depois, cara a cara com essas fitas antigas, resolve reativar tais lembranças e transformá-las em um filme. O resultado final dessas imagens, entrelaçadas com memórias familiares, virou o documentário Estilhaços. Aqui, Natalia entrega uma obra pessoal e ao mesmo tempo instigante e universal. A maneira como cruza o contexto histórico do país com seu regaste familiar é fascinante. Além do caos causado pela explosão, a diretora encara também as dores de um passado que lhe machucou em alguns momentos. As impressionantes imagens caseiras em VHS da época mais parecem cenas de filmes de ficção científica. Há um momento, por exemplo, em que ela mostra o resgate de uma mulher que corre pelas ruas para fugir dos projéteis; algo que poderia muito bem ser visto em um desses blockbusters de Hollywood. Em outra ocasião, mais descontraída, os irmãos brincam de repórteres; e, com toda a ingenuidade de uma criança, se divertem fazendo a cobertura jornalística daquele evento catastrófico. Há delicadeza nesse resgate emocional, ainda que a tristeza permeie a narrativa entre tantas tragédias. Em meio a esse vasto e histórico material de arquivo pessoal muito bem utilizado, Garayalde aproveita também para escancarar a corrupção e a ameaça do setor industrial e militar. Não há medo, e sim coragem. Estilhaços fala de resgate emocional e mostra a força de imagens que sobrevivem a qualquer tempo. É o retorno a um passado analógico que dialoga com um futuro tecnológico impresso em uma potente, criativa e interessante obra audiovisual. (Vitor Búrigo)
*Filme visto no 10º Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba.
Nota do CINEVITOR: