O Dia da Posse

por: Cinevitor

Direção: Allan Ribeiro

Elenco: Brendo Washington

Ano: 2021

Sinopse: Brendo quer ser presidente do Brasil. Enquanto esse dia não chega, ele estuda direito, faz vídeos para as redes, sonha com novas conquistas e se imagina em um reality show, durante a pandemia.

Crítica: Se tem algo que não falta nos filmes de Allan Ribeiro, é sensibilidade. Não seria diferente em O Dia da Posse, longa que abriu a décima edição do Olhar de Cinema. Confinado em seu apartamento com um amigo, por conta da pandemia de Covid-19, o diretor resolve transformar o tédio da quarentena em criatividade. E faz isso muito bem. Logo, o espectador conhece Brendo Washington, o protagonista deste filme, que desde seus 14 anos sonha em ser presidente do Brasil. Aos poucos, esse personagem vai revelando seu carisma para a câmera entre conversas e reflexões sobre a vida. A intimidade entre eles, que se fortalece a cada cena, também é impressa na tela. Como em um reality show, dois amigos vão se descobrindo diante de uma plateia. Inclusive, em um momento de descontração, Allan dirige Brendo em seu possível vídeo de inscrição para o Big Brother Brasil. Enquanto discutem a popularidade do programa, também falam de política. Neste diário pandêmico, o cineasta capta com maestria a rotina dessa quarentena: as chamadas em vídeo com os familiares, os afazeres domésticos, o corte de cabelo em casa, as aventuras na cozinha para acertar uma nova receita, a espiadinha pela janela para observar os vizinhos, entre tantas outras funções que, por conta do confinamento, ganharam uma importância maior dentro de casa. Neste contexto, o simples fato de lavar uma louça ganha outra proporção dentro daquele cotidiano. Impossível não se identificar. Com O Dia da Posse, Allan Ribeiro realiza o mais sincero e certeiro filme feito durante a pandemia; que, por pouco, não virou um gênero cinematográfico. Entre tantas obras realizadas em Zoom, Google Meet e outros aplicativos, o diretor consegue representar perfeitamente a rotina de quem ficou em casa durante muitos dias enquanto o mundo lá fora trazia ameaças cheias de dúvidas. É muito interessante a maneira como ele mesmo descobre o próprio apartamento com sua câmera e como constrói essa narrativa. A montagem, também assinada pelo diretor, é outro ponto forte do filme; a quebra entre as conversas é instigante. De maneira cativante e ao mesmo tempo íntima e sensível, Allan transforma o fazer nada em algo relevante. Há espaço também para discutir, com sutileza, os acontecimentos recentes no país que situam o espectador; ao mesmo tempo em que falam sobre novela, futuro, vizinhos, sonhos. Nada é forçado em O Dia da Posse; tudo acontece naturalmente e se encaixa muito bem. É fato que a câmera gosta de Brendo, que preenche a tela com seu carisma e suas divagações; e com isso, traz questionamentos relevantes sobre os mais variados assuntos. Um personagem único e cativante. Porém, há uma virada primordial no longa. Enquanto tudo parecia um documentário sobre a pandemia, filmado sem pretensão, eis que em certo momento Allan e Brendo revelam um abajur como iluminação. É como se o objeto fosse responsável pela quebra da quarta parede e, a partir daqui, surge o questionamento: o que foi real até agora e o que foi encenado? Com isso, a obra ganha ainda mais força. Não é mais apenas um filme sobre a quarentena; é um filme sobre como fazer um filme na pandemia, dentro de casa. Agora, ao lado de Brendo, Allan também vira protagonista; e a relação entre eles ganha um novo rumo. O Dia da Posse oscila muito bem entre o real e a ficção com humor, seriedade, reflexões, melancolia. Todas as sensações causadas pela pandemia estão nesta narrativa bem elaborada e a miscelânea de emoções se conecta imediatamente ao espectador. Com este filme, Allan entrega uma obra primorosa sobre o mundo real e atual, ainda que seja conduzida pela ficção. O que é verdadeiro ou não nesse roteiro, não importa. Afinal, essa é a magia e o poder do cinema. (Vitor Búrigo)

*Filme visto no 10º Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba.

Nota do CINEVITOR:

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